“Criticar o governo significa arriscar-se a ser sequestrado, intimidado e agredido fisicamente”
A CIVICUS discute as recentes detenções forçadas de ativistas angolanos com Pedro Domingos André “Paka”, mais conhecido como Pedro Paka, coordenador da organização de direitos humanos Movimento Fúria-99.
Em 19 de julho, o Serviço de Investigação Criminal deteve arbitrariamente o ativista Osvaldo Caholo em Luanda, capital de Angola, acusando-o de rebelião e incitação após ele ter dado uma entrevista na qual criticava as políticas do governo. Caholo, que já havia sido condenado em 2015, foi levado de sua casa por policiais à paisana sem mandado. A prisão ocorreu durante uma semana de intensa repressão, com a polícia usando gás lacrimogêneo e balas de borracha contra protestos pacíficos provocados por um aumento no preço dos combustíveis. O advogado de Caholo afirma que o Estado pretende fazer de Caholo um exemplo para dissuadir outros ativistas.
Quais são as condições para o ativismo em Angola?
O espaço cívico está cada vez mais sufocado. Embora a Constituição garanta formalmente as liberdades de reunião, associação e expressão, na prática o Estado reprime sistematicamente as vozes críticas, criminaliza os protestos pacíficos e instrumentaliza instituições como os tribunais, o Serviço de Investigação Criminal, o Ministério Público e a Polícia de Intervenção Rápida para perseguir ativistas e opositores. Hoje, criticar o governo significa arriscar-se a ser sequestrado, detido arbitrariamente, intimidado e agredido fisicamente.
O que aconteceu a Osvaldo Caholo?
O caso Caholo é emblemático da perseguição política disfarçada de legalidade. Ele foi detido a 19 de julho, alegadamente por incitação à rebelião, instigação pública ao crime e apologia pública ao crime. Mas a verdadeira razão é que ele foi um dos organizadores da marcha de 12 de julho contra o aumento dos preços dos combustíveis. Ele transmitiu ao vivo a partir do protesto, explicando o que faria se tivesse poder de decisão, e o vídeo circulou amplamente. Ele também convocou novas manifestações para as semanas seguintes.
As autoridades não apresentaram nenhuma prova concreta de que ele cometeu um crime real. O processo judicial carece de transparência e as autoridades não ofereceram o mínimo de garantias processuais, incluindo a presunção de inocência. Em vez disso, colocaram Caholo em prisão preventiva, usando isso como uma forma de punição antecipada, em vez de uma medida legalmente justificada, reforçando as suspeitas de motivação política.
Como reagiu a sociedade civil?
A sociedade civil tem respondido com indignação e solidariedade. Organizações de direitos humanos, movimentos sociais e alguns jornalistas independentes têm denunciado o caso como mais um episódio de perseguição política.
Eles apontaram que a detenção de Caholo é arbitrária e viola claramente os compromissos internacionais de Angola em matéria de direitos humanos. Ela se enquadra em um padrão crescente de repressão, com o Estado recorrendo cada vez mais à intimidação, à criminalização seletiva e à repressão violenta contra qualquer forma de dissidência política ou social. Este padrão inclui detenções arbitrárias, uso excessivo da força policial, censura, ameaças e um total desrespeito pelo Estado de direito.
Apesar da forte vigilância e do medo, que limita uma mobilização mais ampla, tem havido vigílias, campanhas nacionais de solidariedade e protestos simbólicos, principalmente nas redes sociais.
Que estratégias de protecção podem adotar os defensores dos direitos humanos?
Num contexto tão hostil, os ativistas devem reforçar as suas redes e estratégias de proteção. Precisam de receber formação em segurança física, digital e jurídica, especialmente em zonas periféricas e musseques. Devem utilizar comunicações criptografadas para evitar a espionagem e criar comités de proteção para monitorizar detenções e ameaças e responder em tempo real.
Devem também manter uma documentação sistemática e denunciar os abusos. Com o apoio de alianças regionais e internacionais, devem pressionar o Estado angolano a respeitar os direitos humanos. E devem preservar a memória das violações como forma de mobilizar a sociedade e construir justiça a partir da verdade.
Como defensores dos direitos humanos, enfrentamos todos estes riscos porque acreditamos que a liberdade e a dignidade humana não são negociáveis.